sábado, 11 de abril de 2015

INGO FISCHER


“Não rejeitava serviço”

 
Ingo Fischer
O primeiro dia foi marcado por expectativa. A rua praticamente vazia, passava um automóvel, um caminhão, um carro de mola – a primeira versão dos carros de praça, os taxis de hoje em dia... Algumas pessoas caminhando, alguns ciclistas pedalando na cadência que os levava ao trabalho.
O rapaz sentado à porta da oficina acompanhava tudo, em sua espera.
O segundo dia foi marcado por uma expectativa ainda maior! A rua continuava com o movimento costumeiro. O rapaz sentado à porta da oficina, começou a se perguntar quanto tempo ainda teria que esperar por uma visita. A freguesia não apareceu, e o segundo dia de expediente foi encerrado ao fechar a porta, naquele fim de tarde.
O terceiro dia de espera estava angustiante para o jovem empreendedor. Até que, finalmente, um homem que ele via passar diante da loja todos os dias, a caminho do bar no qual tomaria seu aperitivo antes do almoço, decidiu parar. Parar para conversar – uma conversa que lhe trouxe a oportunidade que esperava!
Era Willy Korman, ele chegou acompanhado por alguns cães que o seguiam para todos os lados que ia. Ele se sentou ao lado do rapaz e uma longa conversa teve início. O homem queria saber o que aquele jovem estava fazendo, todos os dias, sentado diante das portas abertas de uma ampla sala vazia, o olhar parecendo procurar alguém que estivesse para chegar...
Foi quando Ingo Fischer conheceu seu primeiro cliente na oficina de conserto de bicicletas que estava implantando aos 17 anos de idade. O ofício ele aprendera em outra oficina, onde foi trabalhar aos 14 anos para ajudar o sustento de sua família – formada por pai, mãe e outros oito filhos, que moravam em uma colônia na rua São Pedro.

UMA VIDA DIVIDIDA ENTRE
A ESCOLA, A ROÇA E A FÁBRICA

Aos 14 anos, ele se juntara aos irmãos mais velhos e a outros jovens operários da Buettner S/A, uma das maiores indústrias têxteis de Brusque. Acordava cedo e cumpria o expediente das 5 horas da manhã até a 1 hora e meia da tarde. Seus pais não tinham salário – arrecadavam o que a roça rendia. O que não era muito, mas ajudava, considerando que a retirada de lenha no mato garantia o pagamento do estudo para os filhos.
Os irmãos Fischer frequentavam as aulas no Colégio Santo Antônio – hoje São Luiz –, administrado pelas freiras. A mensalidade era paga com o fornecimento de carroçadas de lenha, matéria-prima que as religiosas usavam para manter aceso o fogão do internato.
Cada carroçada de lenha valia 500 réis, naqueles tempos do tostão furado. Ingo ajudava na retirada da lenha no mato, cortava em pedaços que mediam mais ou menos 40 centímetros, o que rendia um empilhamento uniforme. Este serviço era feito nos dias de chuva. Em dia de sol, não tinha conversa: todo mundo ia para a roça!
Mas, Ingo não se adaptou ao trabalho na fábrica... Três meses depois, ele procurou outro caminho, e chegou à oficina de bicicletas de Arlindo Baron, na subida da rua Alberto Torres. Baron, que estava precisando de um ajudante, o contratou na hora!
A partir daquele dia, a vida do garoto começou a mudar. Ele encontrara, afinal, um ofício do qual gostava! E todos os dias, no horário comercial, cumpria expediente na oficina – e a cada dia que passava aprendia algo novo sobre a arte de consertar bicicletas!
Rapidamente, a profissão deixou de ter segredos para ele. Passados pouco mais de dois anos, não havia mais nada a aprender. Foi então que ele decidiu empreender!
Era 1961. Ele saiu às ruas em busca de um lugar para instalar sua oficina de bicicletas. Na casa de Arnaldo Malossi, no número 326 da rua Barão do Rio Branco, estava a resposta: uma sala medindo mais ou menos 60 metros quadrados – mais do suficiente para dar início ao seu empreendimento.
Não tinhas muitas ferramentas – eram produtos caros para se comprar, naqueles tempos. Não tinha dinheiro para mandar fazer uma placa acima da porta, nem para anunciar na imprensa local – nem tinha tantos jornais assim em circulação na praça.


ENFIM, O PRIMEIRO CLIENTE
FOI ATENDIDO!

Na verdade, ninguém sabia que a sua oficina estava ali.
Até que Willy Korman parou para conversar!
Naquele mesmo dia, às 4 horas da tarde, Korman retornou à oficina com um carrinho de mão – aqueles de madeira, com roda grande! – e dentro dele uma bicicleta antiga, enferrujada e desmontada. Era uma relíquia para o jovem empreendedor, uma bicicleta Dürkopp!
Fischer ficou entusiasmado por, finalmente, ter o que fazer em sua oficina! Aliás, aquela Dürkopp daria a ele muito o que fazer nos próximos dois dias! Lixou, recuperou, engraxou, pintou...
Willy quase teve um troço quando viu o serviço concluído:
– Essa não é a minha bicicleta!
Ingo sorriu diante da satisfação do primeiro cliente de sua loja. Korman pagou com gosto pelo serviço, e foi embora feliz da vida – sua velha bicicleta restaurada cheirava à nova!
A partir daquele dia, nunca mais faltou serviço na oficina de bicicletas de Ingo Fischer! Vieram clientes da Limeira, de Santa Terezinha... Teve um dia em que começou a faltar espaço dentro da oficina, e para poder fazer os reparos e as pinturas, algumas bicicletas tiveram que ir para a calçada, na frente da loja.
Era o sinal de que sua oficina se tornara referência na cidade.
Em novembro de 1961, a enchente atrapalhou os negócios do jovem empreendedor. Aliás, atrapalhou a vida da cidade, que ficou 90% submersa depois de três dias de chuvas torrenciais.
No interior da oficina, a marca da água atingiu 1 metro e 20 centímetros. Tudo o que havia dentro dela, a correnteza levou embora. Só não perdeu o compressor de pintura porque um primo de Ingo, que trabalhava em uma padaria defronte a oficina, agiu rápido: arrombou a porta da loja e ergueu o compressor até a bancada na qual ele trabalhava.
Teve que começar tudo de novo. Antes disso, recuperar e restaurar as bicicletas que a água carregou, entregando-as aos seus proprietários.


UMA NOVIDADE CHAMADA INOX,
UM IRMÃO CHAMADO NIVERT

Um novo tempo começou para Ingo Fischer, em 1965.
Em meados daquele ano, seu irmão Nivert trabalhava para a empresa de Valdemar Becker consertando geladeira, máquinas de lavar, balcões frigoríficos... Embora atuando em um ramo diferente, Nivert propôs ao irmão trabalhar ao lado dele, depois do seu expediente na empresa do Becker, no conserto de máquinas. Para isso, precisaria abrir um espaço no interior de sua oficina de bicicletas.
Proposta feita, desafio aceito, começaram a trabalhar juntos.
Logo o espaço ficou interno ficou apertado. A solução foi construir um puxado nos fundos. Com o espaço ampliado, o volume de serviços começou a crescer, especialmente nos anos de 1966 e 1967.
Até que um dia, os irmãos Fischer receberam uma visita que mudou sua vida e impulsionou o empreendimento que hoje tem nome respeitado em todo o território nacional: Irmãos Fischer S/A.
Um agente do setor de higiene publica de Santa Catarina apareceu na oficina e, vendo que trabalhavam com aço inoxidável, perguntou se poderiam fazer mesas com tampo revestido de inox para manipulação de pescados. Até naquele tempo, indústrias do setor pesqueiro trabalhavam com mesas de tampos de granito ou de madeira, a higiene pública queria mudar aquele cenário.
Ingo e Nivert viram fotografias que o visitante trouxe da Alemanha com alguns modelos do que precisava produzir, e os irmãos responderam que seria possível, sim! A partir de então, começaram a atender a uma demanda de serviços cada vez maior para a indústria pesqueira.


COM AS BÊNÇÃOS DO PADRE KLEINE

Ingo tinha uma pequena nota de serviços para cobrar do Hospital de Azambuja, na época administrado pelo padre Guilherme Kleine – referente ao conserto de alguns baldes. Durante a cobrança, ele perguntou ao padre se este poderia lhe fazer um favor. Era preciso comprar uma grande quantidade de chapas de aço inoxidável para conseguir atender à demanda, mas os irmãos Fischer não tinham dinheiro e nem crédito para fazer o volume de compras necessário!
Padre Kleine autorizou que os irmãos Fischer fizessem a compra em nome do Seminário de Azambuja. Quando a encomenda chegava, ele entrava em contato com os Fischer e estes vinham busca-la no Seminário. Assim funcionou por um ano!
Um volume cada vez maior de chapas se fazia necessário comprar. Porque em 1968 a SUDEPE (Superintendência do Desenvolvimento da Pesca), autarquia vinculada ao Ministério da Agricultura, do Abastecimento e da Reforma Agrária, determinou que todas as indústrias de pesca do país tinham que trabalhar sobre aço inoxidável!
Em função disso, o Seminário de Azambuja providenciou – ou melhor, os irmãos Fischer! – um grande volume de compras, o que despertou a atenção do fabricante. Um dia, o fabricante apareceu no endereço que constava da nova fiscal, e no Seminário de Azambuja foi recebido pelo padre Kleine. De lá, ele se dirigiu à rua Barão do Rio Branco, onde conheceu seus verdadeiros clientes, Ingo e Nivert Fischer – para os quais abriu um cadastro e lhes ofereceu a oportunidade que tanto esperavam!

Texto: Revista Lions Berço da Fiação

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