“Não
rejeitava serviço”
O primeiro dia foi marcado
por expectativa. A rua praticamente vazia, passava um automóvel, um caminhão,
um carro de mola – a primeira versão dos carros de praça, os taxis de hoje em
dia... Algumas pessoas caminhando, alguns ciclistas pedalando na cadência que
os levava ao trabalho.
O rapaz sentado à porta da
oficina acompanhava tudo, em sua espera.
O segundo dia foi marcado
por uma expectativa ainda maior! A rua continuava com o movimento costumeiro. O
rapaz sentado à porta da oficina, começou a se perguntar quanto tempo ainda
teria que esperar por uma visita. A freguesia não apareceu, e o segundo dia de
expediente foi encerrado ao fechar a porta, naquele fim de tarde.
O terceiro dia de espera
estava angustiante para o jovem empreendedor. Até que, finalmente, um homem que
ele via passar diante da loja todos os dias, a caminho do bar no qual tomaria
seu aperitivo antes do almoço, decidiu parar. Parar para conversar – uma
conversa que lhe trouxe a oportunidade que esperava!
Era Willy Korman, ele
chegou acompanhado por alguns cães que o seguiam para todos os lados que ia.
Ele se sentou ao lado do rapaz e uma longa conversa teve início. O homem queria
saber o que aquele jovem estava fazendo, todos os dias, sentado diante das
portas abertas de uma ampla sala vazia, o olhar parecendo procurar alguém que
estivesse para chegar...
Foi quando Ingo Fischer
conheceu seu primeiro cliente na oficina de conserto de bicicletas que estava
implantando aos 17 anos de idade. O ofício ele aprendera em outra oficina, onde
foi trabalhar aos 14 anos para ajudar o sustento de sua família – formada por
pai, mãe e outros oito filhos, que moravam em uma colônia na rua São Pedro.
UMA VIDA DIVIDIDA ENTRE
A ESCOLA, A ROÇA E A FÁBRICA
Aos 14 anos, ele se juntara
aos irmãos mais velhos e a outros jovens operários da Buettner S/A, uma das
maiores indústrias têxteis de Brusque. Acordava cedo e cumpria o expediente das
5 horas da manhã até a 1 hora e meia da tarde. Seus pais não tinham salário – arrecadavam
o que a roça rendia. O que não era muito, mas ajudava, considerando que a
retirada de lenha no mato garantia o pagamento do estudo para os filhos.
Os irmãos Fischer frequentavam
as aulas no Colégio Santo Antônio – hoje São Luiz –, administrado pelas
freiras. A mensalidade era paga com o fornecimento de carroçadas de lenha,
matéria-prima que as religiosas usavam para manter aceso o fogão do internato.
Cada carroçada de lenha
valia 500 réis, naqueles tempos do tostão
furado. Ingo ajudava na retirada da lenha no mato, cortava em pedaços que
mediam mais ou menos 40 centímetros, o que rendia um empilhamento uniforme. Este
serviço era feito nos dias de chuva. Em dia de sol, não tinha conversa: todo
mundo ia para a roça!
Mas, Ingo não se adaptou
ao trabalho na fábrica... Três meses depois, ele procurou outro caminho, e
chegou à oficina de bicicletas de Arlindo Baron, na subida da rua Alberto
Torres. Baron, que estava precisando de um ajudante, o contratou na hora!
A partir daquele dia, a
vida do garoto começou a mudar. Ele encontrara, afinal, um ofício do qual
gostava! E todos os dias, no horário comercial, cumpria expediente na oficina –
e a cada dia que passava aprendia algo novo sobre a arte de consertar
bicicletas!
Rapidamente, a profissão
deixou de ter segredos para ele. Passados pouco mais de dois anos, não havia
mais nada a aprender. Foi então que ele decidiu empreender!
Era 1961. Ele saiu às ruas
em busca de um lugar para instalar sua oficina de bicicletas. Na casa de Arnaldo
Malossi, no número 326 da rua Barão do Rio Branco, estava a resposta: uma sala
medindo mais ou menos 60 metros quadrados – mais do suficiente para dar início
ao seu empreendimento.
Não tinhas muitas
ferramentas – eram produtos caros para se comprar, naqueles tempos. Não tinha
dinheiro para mandar fazer uma placa acima da porta, nem para anunciar na
imprensa local – nem tinha tantos jornais assim em circulação na praça.
ENFIM, O PRIMEIRO CLIENTE
FOI ATENDIDO!
Na verdade, ninguém sabia
que a sua oficina estava ali.
Até que Willy Korman parou
para conversar!
Naquele mesmo dia, às 4
horas da tarde, Korman retornou à oficina com um carrinho de mão – aqueles de
madeira, com roda grande! – e dentro dele uma bicicleta antiga, enferrujada e
desmontada. Era uma relíquia para o jovem empreendedor, uma bicicleta Dürkopp!
Fischer ficou entusiasmado
por, finalmente, ter o que fazer em sua oficina! Aliás, aquela Dürkopp daria a
ele muito o que fazer nos próximos
dois dias! Lixou, recuperou, engraxou, pintou...
Willy quase teve um troço quando viu o serviço concluído:
– Essa não é a minha
bicicleta!
Ingo sorriu diante da
satisfação do primeiro cliente de sua loja. Korman pagou com gosto pelo serviço, e foi embora feliz da vida – sua
velha bicicleta restaurada cheirava à nova!
A partir daquele dia,
nunca mais faltou serviço na oficina de bicicletas de Ingo Fischer! Vieram
clientes da Limeira, de Santa Terezinha... Teve um dia em que começou a faltar
espaço dentro da oficina, e para poder fazer os reparos e as pinturas, algumas
bicicletas tiveram que ir para a calçada, na frente da loja.
Era o sinal de que sua
oficina se tornara referência na cidade.
Em novembro de 1961, a
enchente atrapalhou os negócios do jovem empreendedor. Aliás, atrapalhou a vida
da cidade, que ficou 90% submersa depois de três dias de chuvas torrenciais.
No interior da oficina, a
marca da água atingiu 1 metro e 20 centímetros. Tudo o que havia dentro dela, a
correnteza levou embora. Só não perdeu o compressor de pintura porque um primo
de Ingo, que trabalhava em uma padaria defronte a oficina, agiu rápido: arrombou
a porta da loja e ergueu o compressor até a bancada na qual ele trabalhava.
Teve que começar tudo de
novo. Antes disso, recuperar e restaurar as bicicletas que a água carregou,
entregando-as aos seus proprietários.
UMA NOVIDADE CHAMADA INOX,
UM IRMÃO CHAMADO NIVERT
Um novo tempo começou para
Ingo Fischer, em 1965.
Em meados daquele ano, seu
irmão Nivert trabalhava para a empresa de Valdemar Becker consertando geladeira,
máquinas de lavar, balcões frigoríficos... Embora atuando em um ramo diferente,
Nivert propôs ao irmão trabalhar ao lado dele, depois do seu expediente na
empresa do Becker, no conserto de máquinas. Para isso, precisaria abrir um
espaço no interior de sua oficina de bicicletas.
Proposta feita, desafio
aceito, começaram a trabalhar juntos.
Logo o espaço ficou interno
ficou apertado. A solução foi construir um puxado nos fundos. Com o espaço
ampliado, o volume de serviços começou a crescer, especialmente nos anos de 1966
e 1967.
Até que um dia, os irmãos
Fischer receberam uma visita que mudou sua vida e impulsionou o empreendimento
que hoje tem nome respeitado em todo o território nacional: Irmãos Fischer S/A.
Um agente do setor de
higiene publica de Santa Catarina apareceu na oficina e, vendo que trabalhavam
com aço inoxidável, perguntou se poderiam fazer mesas com tampo revestido de
inox para manipulação de pescados. Até naquele tempo, indústrias do setor
pesqueiro trabalhavam com mesas de tampos de granito ou de madeira, a higiene
pública queria mudar aquele cenário.
Ingo e Nivert viram
fotografias que o visitante trouxe da Alemanha com alguns modelos do que
precisava produzir, e os irmãos responderam que seria possível, sim! A partir
de então, começaram a atender a uma demanda de serviços cada vez maior para a
indústria pesqueira.
COM AS BÊNÇÃOS DO PADRE KLEINE
Ingo tinha uma pequena
nota de serviços para cobrar do Hospital de Azambuja, na época administrado
pelo padre Guilherme Kleine – referente ao conserto de alguns baldes. Durante a
cobrança, ele perguntou ao padre se este poderia lhe fazer um favor. Era
preciso comprar uma grande quantidade de chapas de aço inoxidável para
conseguir atender à demanda, mas os irmãos Fischer não tinham dinheiro e nem
crédito para fazer o volume de compras necessário!
Padre Kleine autorizou que
os irmãos Fischer fizessem a compra em nome do Seminário de Azambuja. Quando a
encomenda chegava, ele entrava em contato com os Fischer e estes vinham
busca-la no Seminário. Assim funcionou por um ano!
Um volume cada vez maior
de chapas se fazia necessário comprar. Porque em 1968 a SUDEPE
(Superintendência do Desenvolvimento da Pesca), autarquia vinculada ao
Ministério da Agricultura, do Abastecimento e da Reforma Agrária, determinou
que todas as indústrias de pesca do país tinham que trabalhar sobre aço
inoxidável!
Em função disso, o
Seminário de Azambuja providenciou – ou melhor, os irmãos Fischer! – um grande
volume de compras, o que despertou a atenção do fabricante. Um dia, o
fabricante apareceu no endereço que constava da nova fiscal, e no Seminário de
Azambuja foi recebido pelo padre Kleine. De lá, ele se dirigiu à rua Barão do
Rio Branco, onde conheceu seus verdadeiros clientes, Ingo e Nivert Fischer –
para os quais abriu um cadastro e lhes ofereceu a oportunidade que tanto
esperavam!
Texto: Revista Lions Berço
da Fiação
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