sábado, 11 de abril de 2015

HENNING JÖNK

Henning Jönk

"Tendo qualidade, temos clientes!"

            Carro de boi. Esta era a única expressão da língua portuguesa que Henning Jönk conhecia ao ser matriculado na Escola Alemã em 1939, aos seis anos de idade. Na casa onde vivia com seus pais e irmãos na comunidade rural de Bateias, a língua oficial era a mesma falada pelos pais e avós. Aliás, em casa e em todos os quadrantes de Brusque, predominava a língua alemã.
            O menino estudava na Deutsche Evangelische Schule, fundada em 1872, mantida pela Fundação Educacional da Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil. Naqueles tempos, era denominada Escola Evangélica Alberto Torres, e mais tarde passou a ser Colégio Cônsul Carlos Renaux. Porém, a língua alemã deixara de ser ouvida em sala de aula. Uma agressiva campanha de nacionalização do governo Getúlio Vargas impôs medidas que visavam diminuir na marra a influência das comunidades de imigrantes estrangeiros no Brasil, obrigando sua integração à população que falava português.
            A primeira medida foi aplicada em 1938, com a obrigação do ensino da língua portuguesa. Com isso, escolas trocaram sua denominação estrangeira para nomes brasileiros, apenas profissionais nascidos no Brasil podiam dirigir unidades escolares e trabalhar como professores. Em 1939 foi proibido falar idiomas estrangeiros em público, o Exército fiscalizava áreas de colonização estrangeira; Brusque era uma delas.
            Foi um tempo de medo e de estranhezas. As professoras de Henning Jönk eram Hilda Niebuhr Krauser e Hildegard Hoffmann Pantaleão, ambas de origem alemã, que falavam fluentemente o idioma materno, mas que também eram forçadas a ministrar aulas apenas em português!
            Enquanto Henning crescia, frequentava as aulas e ajudava seus pais e irmãos nos afazeres da casa, o Brasil também mudava e crescia. Em 1942, o país aderiu à Segunda Guerra Mundial. Soldados da Força Expedicionária Brasileira foram enviados aos campos de batalha italiano. A repressão aos imigrantes alemães, italianos e japoneses foi intensificada em terras brasileiras. Para viajar dentro do país era preciso autorização, o salvo conduto. Foram apreendidos livros, revistas, jornais e documentos estrangeiros. Parte da memória histórica da imigração foi destruída, mas quem desobedecesse ordens ou se negasse a falar português, era preso!

O JOVEM PLANTADOR DE ARROZ
           
            Ao completar seus estudos, Henning sabia que o trabalho na lavoura o esperava. Era o que ele queria fazer: plantar arroz!
            Nascido em Brusque em 9 de de março de 1933 pelas mãos da parteira Frau Fuchs, Henning é filho de Bertha Maria Fuerbringer e de Max Jönk. Ao lado do pai e dos irmãos, começou a plantar arroz aos 12 anos de idade. O que não quer dizer que tenha passado seu tempo de infância apenas brincando pelos arredores da casa paterna!
            Ele, assim como seus irmãos menores, ajudava em algumas das muitas tarefas da casa, depois da volta da escola, um percurso de 10 quilômetros que era feito diariamente a pé. Caminhava de pés nus sobre a estrada de terra temperada pelo sol quente ou pela geada, períodos nos quais a passagem de uma carroça vazia era uma certeza de carona! Era mais fácil conseguir tal carona do que se acostumar ao primeiro sapato...
            Depois de cumpridas as tarefas escolares, ele e seus irmãos menores eram responsáveis pelo corte do capim, pela limpeza dos coxos e por picar aipim para o trato dos animais. Quando a noite chegava, fosse inverno ou verão, o serviço tinha que estar pronto e os animais tratados. A distância entre a casa dos Jönk e a casa dos empregados obrigava a família a servir as refeições e a provê-los de alojamento. Então, a família foi crescendo, crescendo...
            Sem energia elétrica, a solução estava em prover a casa de geradores de energia ou turbina, que tinham hora para ser desligados. Quem quisesse continuar com a leitura de livros, revistas e jornais, um hábito estimulado pelos pais, tinha que partir para um recurso simples, mas eficiente: a luz de velas! O quarto de Henning era no sótão, onde sua vela ardia até o fim! Hoje, o livro ainda é companheiro inseparável de Henning Jönk, que afirma: "Leio até no escuro!".

A CARROCINHA DA MANTEIGA E DO LEITE

            Ainda há quem se lembre da carrocinha da manteiga e do leite, que percorria as ruas de Brusque em 1956. Fazia entregas em casas de particulares e no balcão da Loja Renaux, que revendia estes produtos no centro urbano de Brusque. O boleeiro, sempre alegre e disposto, se chamava Cândido; era ele quem transportava a produção da família Jönk.
            Era um tempo sem energia elétrica e sem geladeira! Não havia como armazenar manteiga ou leite por muito tempo. A manteiga produzida na segunda-feira era entregue e precisava ser acondicionada em local o mais fresco possível, para garantir a conservação e paladar agradáveis.
            Henning e seu irmão Bruno vendiam leite em garrafas de vidro, de boca grande, fechadas com rolhas de cortiça. Quando a carrocinha retornava à propriedade dos Jönk, começava uma delicada e inadiável operação. As garrafas eram lavadas e devidamente higienizadas para sua reutilização no dia seguinte.

ARROZ JÖNK

            Nas décadas de 1960 e 1970, a família Jönk plantava em uma área de 50 a 80 hectares de terra. O arroz era sua principal produção, o que estimulou Henning a investir na implantação de uma empresa para beneficiamento do produto. Havia oito engenhos de arroz nas redondezas. Hoje, não há nenhum.
            Antes disso, instalou uma moenda de milho, beneficiando o produto que vinha em caminhões do Paraná, e distribuindo fubá para Brusque inteira. Na terça-feira, atendia determinada região; sexta-feira, outras regiões... O próprio Henning dirigia a caminhonete.
            A ideia de beneficiar o arroz que produzia em suas terras foi uma consequência. Tinha produção razoável, havia comprado uma máquina antiga que fazia o beneficiamento... Aliás, o próprio Henning comprou, montou e a colocou para funcionar, quando ainda não dispunham de energia elétrica na comunidade de Bateias. Determinado a colocar a máquina em funcionamento, encontrou a solução em um trator! Isso mesmo: um trator com uma polia adaptada á sua lateral, movimentava o engenho de Jönk! E assim foi, até que cerca de um ano mais tarde a rede de energia elétrica foi implantada na comunidade.
            O arroz beneficiado era vendido no Brasil inteiro, de Curitiba à Fortaleza, todo mundo conhecia o arroz Canário. Até que um dia, o Arroz Canário teve que mudar sua denominação, pois já havia um produtor que usava esta marca, em outro ponto do país. Foi quando surgiu a marca Arroz Jönk; o produto mudou de nome, mas a qualidade continuou a mesma! Aliás, Henning Jönk sempre primou pela qualidade dos produtos e das marcas que empreendeu. "Tendo qualidade, temos clientes", afirma Jönk: "O cliente se torna parceiro na atividade, e todos ganham!".
            No início, o arroz era acondicionado em sacos de 60 quilos, confeccionados em fio de algodão fabricados pelas famílias Maffezzolli, da rua do Centenário, e de Vladislau Schmitt, de Guabiruba. O tempo passou, surgiram as embalagens menores, de cinco quilos e de um quilo, quando a empresa Jönk passou automatizar seus serviços. Os sacos de 60 quilos deram lugar a fardos de 30 quilos, que eram carregados em carretas para a região nordeste do país, e em caminhões para o mercado paulista.
            A modernidade chegou ao engenho de beneficiamento e às áreas de plantação, que receberam novos tratores e com isso diminuíram o volume de mão de obra necessário para a produção do arroz. Com a ajuda das máquinas e dos implementos, três pessoas davam conta da preparação da terra, do plantio e da colheita.
            "Sempre achei a lavoura rentável e boa, por isso sempre investi no arroz", observa Henning Jönk, que na comunidade de Bateias se casou com Alicete Maria Schlindwein e com ela constitui família. Os filhos, assim como os empreendimentos da família, foram crescendo... e a preocupação do casal com um lugar no qual seus cinco filhos pudessem trabalhar, também cresceu!

"NÃO É SÓ O DINHEIRO QUE NOS FAZ SER GENTE"

            Melhorar e ampliar. O cumprimento destas duas metas norteia a família de Henning Jönk até os dias de hoje. Ao mesmo tempo em que se preocupava com a produção do arroz, e posteriormente com a criação de uma segunda empresa, a HJ Tinturaria, ele jamais descuidou do meio ambiente.
            Aos 70 anos, Henning começou a investir em reflorestamento. Hoje, são 3 milhões de árvores, suas fazendas não têm área sem ocupação, exceto as áreas protegidas, cujas extensões são respeitadas além dos índices exigidos por lei. Grande parte do eucalipto produzido nas fazendas é utilizada como combustível para as caldeiras. Desde 2002, ele planta eucaliptos sem parar!
            "Não é só o dinheiro que nos faz ser gente", pondera Henning Jönk. Para ele, o segredo do sucesso de uma empresa está no relacionamento com sua clientela. É preciso trabalhar entrosado com o cliente! E, é claro, estar sempre alerta para tudo, o que inclui o surgimento de novas oportunidades!
            Uma delas surgiu durante uma conversa numa mesa de cerveja do Clube de Caça e Tiro Araújo Brusque, onde ele gosta de se reunir com amigos. Um desses amigos disse que em Joinville duas tinturarias haviam encerrado suas atividades e estavam com seu maquinário à venda.
            Henning não contou tempo! Na companhia do amigo Lino Fischer, entrou em contato com o administrador do espólio das empresas e foi a Joinville conhecer o maquinário. Equipamento visto, negócio feito! Algumas das máquinas adquiridas naquele dia, embora já inativas, ainda podem ser vistas na área da HJ Tinturaria, e uma das calandras ainda está em atividade, desde 1992.
            "Era um tempo no qual o parque industrial de Brusque estava carente de tinturarias", analisa Henning Jönk Filho, o Henninho, que ao lado do pai administra a HJ desde sua fundação. "Meu pai sempre quis saber tudo sobre a área em que está ou na qual pretende empreender. Tivemos sorte, também, iniciamos o trabalho em uma época boa".
            Nos dois primeiros anos, trabalharam precariamente em uma área desativada do engenho de arroz, onde foi criada a estrutura básica para funcionamento da tinturaria. A primeira providência foi cuidar do tratamento de efluentes. Hoje, a empresa é reconhecida mundialmente por estas atitudes, e recebe com frequência a visita de empreendedores franceses, chineses e italianos, que vêm conhecer o seu cuidado com a questão ambiental.
            Para Henning pai e Henning filho, ampliar a economia de água é compromisso com o futuro. O desafio é tentar desenvolver uma máquina que não utilize água na tinturaria porque água tem que ser tratada com carinho, e o reflorestamento ajudam muito neste processo.

TEORIA ALIADA À PRÁTICA

            Aos jovens empreendedores, Henning Jönk faz um lembrete: "É bom ter teoria, mas aliada à pratica. Nunca só a teoria dará resultados. Tem que meter a mão, encarar pessoalmente os desafios, buscar o conhecimento porque para tudo que se quer empreender é possível encontrar orientação, nos dias de hoje. Em livros, em publicações especializadas ou na internet, para tudo encontramos orientação para seguir em frente!".
            Ao mesmo tempo, lamenta a falta de interesse de alguns jovens pela leitura, o que na sua opinião é ferramenta indispensável para um empreendedor.

            Hoje, quando seus olhos azuis percorrem as terras que teve a oportunidade de lavrar e cuidar, cresce em seu coração a esperança de que a nova empresa continue com toda força... e que um dia um de seus netos reative a produção do arroz, interrompida há alguns anos. Quando isso acontecer, um grande ciclo estará completo. E uma nova história de sucesso irá brotar na terra fértil de Bateias, onde Henning cresceu, trabalhou, criou seus filhos... Uma terra pela qual devota tanto amor!

Texto: Revista Lions Berço da Fiação

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